maio 27

O Meu Cachorro Só Pode Comer Ração MESMO?

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A afirmação é comum: “cachorro só pode comer ração, comida de gente faz mal para eles!”. Seja por recomendação veterinária, por conselho de amigos, ou dicas dos entendidos, a ideia de que cachorro só pode comer ração é disseminada. E qual é o fundamento disso?

Cão olhando ração
Imagem: Money Crashers

Certa vez, em uma aula sobre obesidade canina, um professor me perguntou:

“O que os seus cachorros comem?”

“Só ração, professor!” Respondi, orgulhosa.

“Só ração?”

“Sim, só ração!”

“E eles gostam de sorvete?”

Esta pergunta me deixou um pouco confusa, mas respondi “Não sei, nunca dei…”.

“E de pão, eles gostam?” replicou o professor

“Aaah, disso eles gostam!”

“Então, vou refazer a minha pergunta: os seus cães comem só ração?”

hmmmmm… <barulhos de grilos…>

Pois é. Meus cachorros não comiam só ração. Tutora ruim. E o pior: veterinária ruim! Que vergonha…

Mas, não. A intenção dele não era apontar dedos, mas mostrar o quanto nós criamos alguns hábitos dos quais sequer nos damos conta. Então, o seu cachorro só come ração. E um pãozinho de vez em quando. E um bifinho por dia. Aah, e aqueles palitinhos, não dá para viver sem. Carne, só no dia do churrasco. Deu para entender?

Comida de gente ou comida de cachorro?

Aquela aula era sobre obesidade canina, e o exemplo do professor foi para ilustrar o como é difícil para os tutores (e até mesmo nós, veterinários) manterem a disciplina na alimentação dos cães (na nossa também, né? rsrsrs). Você não entende porque o seu cão está acima do peso, enquanto, inconscientemente, continua enchendo ele de petiscos. Bom, os meus cachorros comiam um pãozinho ocasional, mas não eram obesos. Quer dizer, a minha cadelinha na época tinha uma “pancinha”, mas totalmente justificada pela sua Síndrome de Cushing. Então vem a questão: é errado dar “comida de gente” para cachorros?

Imagem: Doggy Foods
Imagem: DoggyFoods.com

Bom, primeiro precisamos trabalhar um conceito importante: o que é “comida de gente”? Porque, vejamos, na natureza, animal nenhum come ração.  Conforme a espécie, os animais comem carne, frutas, vegetais, insetos, etc. Carne é “comida de gente”? fruta é “comida de gente”? se pararmos para pensar, não… é, simplesmente, “comida”. Tudo bem, pão também não tem na natureza… mas muita gente dá para o cachorro comer, isso é fato. A ração é um produto industrializado, criado por humanos, para tornar as nossas vidas mais práticas e para facilitar a nutrição animal (assim, as pessoas não precisam se preocupar em escolher ou preparar os ingredientes para alimentar os seus animais: já vem tudo calculado e pronto para consumo).

O que torna um alimento próprio ou impróprio para um cachorro não é o fato de ser “ração” ou “não-ração”, mas a qualidade deste alimento, a sua toxicidade em potencial, e a forma como foi conservado. Uma carne de qualidade, bem conservada, vai fazer mal para um cachorro só porque não é ração? se estivermos pensando num cão saudável, pelo menos, não (cães com insuficiência renal podem ter restrições quanto a isso).  Inclusive, cães são carnívoros, foram feitos para comer carne. E cebola? bom, cebola, sim, pode ser perigosa – mas não porque não é ração, e sim porque é tóxica para cães. Assim como o chocolate, o xilitol (adoçante), o alho (em grandes quantidades), entre outros. Então, este é o primeiro cuidado que devemos tomar. Não dar alimentos potencialmente tóxicos.

Buscando o equilíbrio

O segundo cuidado, é claro, se refere ao equilíbrio nutricional. Uma boa ração contém tudo o que um cão precisa, dispensa complementos. Quando se dá um petisco a ele – seja uma carne, uma fruta, ou um bifinho -, precisamos nos lembrar de que este petisco contém calorias e nutrientes, e que isso vai interferir no equilíbrio da dieta dele. Um petisco ocasional, dado com moderação, não terá grandes impactos na saúde do cão. Mas, por exemplo, se um dia você decidir dar um bife inteiro para o cachorro, lembre-se de compensar isso na quantidade de ração fornecida. Ou seja, quando fornecer petiscos, diminua um pouquinho a ração. Lembre-se, também, de que a porção deve ser proporcional ao tamanho de um animal. Uma porção pequena para um humano de 60Kg pode ser um banquete para um cão de 2 Kg! A médio prazo, este cuidado ajuda a prevenir a obesidade. Cães que comem petiscos regularmente tendem a se tornar obesos, justamente porque esta compensação não é feita.

Imagem: Doggy Foods
Imagem: DoggyFoods.com

E o que dizer do hábito de misturar “alguma coisa gostosa” na ração, para melhorar o seu consumo? algumas pessoas misturam carne, bifinhos, ou patezinho na ração, para torná-la mais apetitosa. Pode? pode, com moderação. Particularmente, entre estas opções, consideramos que a “latinha” (ou “patezinho”) seria a mais indicada, já que ela é, por si só, um tipo de ração – portanto, a sua composição já é mais ou menos equilibrada. Existem inclusive patezinhos específicos para cães com doenças cardíacas, renais, hepáticas, entre outras. Tenha em mente, entretanto, que, se a ideia é “dar sabor” à ração, uma colherada pequena (mesmo para cães grandes) é suficiente, guarde o restante na geladeira para a refeição seguinte. Misturar uma lata inteira de patezinho na ração só vai fazer com que o seu cão engorde. O uso de bifinhos picados, ou mesmo carne, misturados na ração, pode ser feito esporadicamente e com moderação, desde que o seu cão não tenha restrições alimentares e que seja feita a devida compensação na quantidade de ração.

Mas, preste atenção: não estamos dizendo que você pode trocar um prato de ração por um pacote de bifinho – os bifinhos são petiscos, e devem ser tratados como tal. É a mesma coisa que trocar um almoço por uma barra de chocolate. Talvez você consiga compensar as calorias, mas, nutricionalmente falando, não é uma boa troca. Mas, e um prato de ração por um prato de arroz com carne? se for algo ocasional, não vai fazer mal ao cão, mas se quiser trocar definitivamente a ração por comida caseira, procure orientação nutricional junto ao seu médico veterinário.

Deixando a ração de lado…

A dieta caseira para cães é uma excelente opção, principalmente para animais com alergias ou restrições alimentares, ou paladares mais exigentes. Existem diversas variações,  desde dietas cruas com ou sem ossos, a dietas cozidas. É possível excluir completamente os grãos da alimentação do cão, ou é possível mantê-los, conforme a orientação do nutricionista veterinário. Enfatizamos bastante a questão da orientação nutricional, porque dar alimentação caseira para um cachorro não é a mesma coisa que “dar resto de comida”. Os cães têm necessidades nutricionais diferentes das nossas, e, ainda que a sua família tenha hábitos alimentares saudáveis, é preciso compreender que uma boa alimentação para humanos é diferente de uma boa alimentação para cães. Isso quer dizer, de forma mais direta, que você vai precisar cozinhar para o seu cachorro. Se você tiver o tempo e a disposição, ótimo; mas, se for muito difícil fazer isso, é melhor continuar com a ração, e fazer um agradinho ocasionalmente, respeitando as restrições alimentares que o seu cão possa ter. Preferimos não ser radicais, e compreender que, conforme o estilo de vida de cada tutor, pode-se optar pela ração ou pela alimentação caseira, desde que os alimentos (industrializados ou não) sejam de qualidade.

O “pãozinho nosso de cada dia”

Evite criar o hábito de dar petiscos diariamente, o ideal é que eles sejam algo “especial”, diferente. Uma recompensa por um bom comportamento, por um comando obedecido, e não a sua única forma de demonstrar amor pelo seu cão. Acredite, ele vai continuar te amando mesmo sem ganhar petiscos.

Os melhores petiscos para todos os cães são frutas e legumes. São  saudáveis, pouco calóricos, têm vitaminas, e são muito bem aceitos pela maioria dos cães. E, veja só: pelo conceito que a maioria das pessoas tem, frutas são “comida de gente”, enquanto bifinhos, por exemplo são “comida de cachorro” … Mas justo as frutas (comida de gente) são muito mais recomendáveis como petiscos do que os bifinhos (comida de cachorro) – só tome cuidado com as uvas e passas, elas são tóxicas para cães!

Imagem: Money Crashers
Imagem: Money Crashers

Se o seu cão for obeso, além de dispensar os petiscos mais “gordinhos” – ou dispensar todos os petiscos de vez -, procure  o seu médico veterinário para criar um plano de emagrecimento para o seu cão, para que ele possa perder peso de forma saudável e gradual.


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  1. Doutora Barbara

    Teria alguma dica de alimentação para cães com síndrome de cushing, tenho uma SRD, que adotamos de rua e foi diagnosticada, que tipo de ração devo buscar ?
    grata.

    1. Olá, Jane! Vai depender se ela tem só Cushing, ou se tem mais alguma doença associada, como insuficiência cardíaca ou renal, por exemplo…

      Não existem rações específicas para a Síndrome de Cushing, mas, se ela não tiver nenhuma outra doença e estiver dentro de um peso adequado, uma ração light pode ser uma boa opção.

      As rações light não têm como objetivo a perda do peso, mas sim a sua manutenção, através do aumento da saciedade. Cães com esta doença sentem muita fome e tendem a ganhar peso, além de procurarem alimentos em locais inapropriados, como na lixeira. A ração light ajuda a manter o cão mais saciado e dentro de um peso adequado. Se o seu veterinário considerar necessário, ela pode eventualmente receber alguma suplementação.

  2. Doutora Bárbara,

    Meus cães comem basicamente AN, mas entre as refeições ou à noite dou ração, sempre distante das refeições (Dog Chow). Posso fazer isso ou é inadequado?
    Faço pensando em suprir a eventual falta de algum nutriente.

    Outra dúvida: cloreto de magnésio realmente é bom e seguro para os cães?

    Obrigada,

    1. Normalmente, é mais recomendável que a pessoa opte por uma ou outra dieta. Isso porque, ao comer um pouco de ração e um pouco de AN, o cão não consumirá a quantidade correta nem de um tipo de alimento, e nem do outro – e isso sim pode levar a deficiências nutricionais.

      Para que a AN seja feita corretamente, é necessário que haja a orientação de um nutricionista veterinário. O profissional que prescrever a dieta tomará o cuidado de garantir que, se o cão ingerir todos os alimentos recomendados, então todas as necessidades dele serão atendidas – e, se for o caso, ele poderá prescrever algum suplemento. Mas, nesse caso, é melhor suplementar do que adicionar ração à AN.

      Sobre o cloreto de magnésio, não há, até o momento, evidências científicas que justifiquem o seu uso, salvo se o animal tiver alguma deficiência deste nutriente. O que existe são muitos relatos destacando os seus benefícios.

      1. Agradeço novamente por sua resposta, Doutora Bárbara.
        Agora ficou bem claro para mim qual é o procedimento correto.

        Gostaria de sugerir a criação de uma newsletter, assim os leitores receberão seus artigos também por e-mail.

        Até mais!

          1. Eu não havia reparado mesmo, já me inscrevi! Obrigada por me enviar o link. 🙂

  3. Òtimo artigo. Tenho uma sdr/daschund de 10 anos que engordou muito após a castração. Diminuí as poções de ração e faço passeios diários de 20 min. em média. Ela não emagrece. Passa o dia todo no sofá, pois não tenho quintal ( quando tinha, ela corria e latia o tempo todo e era bem magra). Trabalho e não tenho como estimula-la.
    Adotei um cão mais jovem para fazer companhia …ele bem que tenta brincar, mas ela gosta mesmo é de dormir. Inclusive está com o coração aumentado. Não sei o que fazer…

    1. Olá, Cristina! Muito obrigada!

      Converse com o seu veterinário ou com um nutricionista veterinário sobre a possibilidade de fazer um plano de emagrecimento para ela. Ele irá ajudá-la a calcular as quantidades corretas de ração, e até mesmo poderá recomendar uma ração diferente, se for o caso. Também é importante que vocês façam um “check up” geral nela, já que algumas doenças podem fazer com que o emagrecimento se torne realmente mais difícil.

      Os Daschunds em particular são cães que devem ser mantidos sempre dentro de um peso adequado, devido à sua alta propensão a problemas de coluna. O excesso de peso nesses cães pode causar hérnias de disco e doenças articulares.

      Ah, e não deixe de ler este artigo sobre cães gordinhos: https://www.meucaovelhinho.com.br/artigos/nutricao/o-seu-cao-esta-gordinho/

      Um abraço!

  4. Olá, Bárbara! Tudo bem?
    Meu cachorro tem 14 anos e é um vira lata. Ele teve pancreatite e pedras nos rins além de uma suspeita de diabetes. Ele tem que comer a ração da Hills por 15 dias para fazer uma curva glicemica, porém, ele não aceitou a ração de jeito nenhum. Passou metade de um dia sem comer mas viámos que estava com fome. Fiz um peito de frango, abobora, cenoura e chuchu pra ele comer. Ele comeu muito bem, depois fiz um purê de legumes e misturei com metade da porção de ração triturada que ele deveria comer e ele aceitou bem mas a ração pura ele não come. Posso continuar com essa alimentação?

    1. Olá, Laryssa! Tudo bem?
      A princípio, não recomendo misturar dieta caseira com ração, já que isso pode fazer com que o cão acabe não ingerindo todos os nutrientes de que necessita, ou então, que acabe comendo até demais.

      Uma ração já vem com todos os ingredientes devidamente balanceados, e o cão deve ingerir uma quantidade “X” (que varia de um animal para o outro) para ter as suas necessidades supridas… A dieta caseira não vem com todos os ingredientes balanceados: você precisará fazer isso! Então, a minha primeira observação em relação à dieta caseira é que ela deve ser usada sob a orientação do seu veterinário ou de um nutricionista veterinário, que irá te ajudar a elaborar um cardápio, inclusive explicando a quantidade de cada ingrediente que deverá ser usada.

      Ao misturar uma dieta caseira com a ração, o cão acaba não comendo tudo o que deveria nem do alimento industrializado, e nem do alimento feito em casa. Ou, talvez, coma mais do alimento feito em casa do que deveria… é difícil encontrar o equilíbrio, entende? então, sugiro que opte por apenas um tipo de alimento: ou a ração ou a comida caseira (sob orientação veterinária).

      Se a sua intenção for simplesmente tornar a ração um pouco mais atrativa, você até pode misturar um pouquinho de um molho de carne, ou de um patezinho próprio para cães, na ração. Mas é só um poquinho mesmo – algo como uma colherada por refeição já está de bom tamanho para não interferir no equilíbrio da dieta dele.

      Um abraço!

  5. Olá, Barbará! Tudo bem?
    Foi constatada a presença de cardiopatia na minha cachorrinha. A veterinária inseriu dieta de ração cardiopata, no entanto, achei os grãos da ração royal canin muito grandes e ela tem porte pequeno. Sabes se há outra ração para cardiopata que seja boa também e que contenham grãos menores?
    Obrigada pela ajuda!!
    Abraço,
    Nathália

  6. Tenho um cão idoso com 18 anos da raça pastor com vira lata ele está com a síndrome da cauda caída não tem cura isso ou tem algum remédio novo que possa ajuda lo

    1. Bom dia, Berta!
      Seria a síndrome da cauda equina?

      A síndrome da cauda equina é causada por um problema na coluna que causa compressão dos nervos. A depender do grau da compressão, os sinais podem ser mais ou menos graves, variando desde uma leve claudicação (manqueira) até a impossibilidade de caminhar, com incontinência urinária e fecal. Também pode acontecer de o animal ter atonia vesical, que é quando ele não consegue eliminar a urina, de modo que é preciso ajudá-lo a urinar toda vez.

      Em relação ao tratamento, o primeiro e mais fundamental passo é fazer com que o cão emagreça, se ele estiver acima do peso. As principais complicações geralmente acontecem em cães obesos.

      Conforme o grau da lesão, é possível fazer o tratamento com fisioterapia, que poderá incluir exercícios ativos (o animal faz) ou passivos (uma pessoa movimenta as articulações dele), laser terapia, infravermelho, e ultrassom terapêutico. Qual(is) desses métodos será(ão) utilizados, fica a critério do vet fisioterapeuta, que irá avaliar o grau da lesão e a necessidade de cada animal.

      Se a lesão estiver mais avançada, a cirurgia pode ser necessária. Cabe colocar que, se a lesão já for muito grave, mesmo a cirurgia pode não resolver o problema.

      Por fim, tem os medicamentos. Não existe nenhum medicamento capaz de corrigir diretamente este problema, o que se faz é controlar a dor e diminuir a inflamação local. A diminuição da inflamação por si só pode ajudar bastante, mas normalmente não é suficiente para resolver o problema. O seu vet poderá prescrever os medicamentos mais adequados para o seu cão, mas, mesmo assim, tenha em mente que a fisioterapia continua sendo de fundamental importância.

      Espero ter ajudado,
      Um grande abraço!

      1. Boa noite tenho um pincher e ele nao quer comer raçao levei ao veterinario e me passou uma alimentaçao caseira mas ele comeu so um dia e nao quiz mais o dr disse q e p deixar ele sem comer por uns dias que quando senti fome ele come mas ja fiz isso mas nao come msm
        Para poder comer tem q tomar vitamina para abrir o apetite
        Oq devo fazer?? Para que ele venha comer ??

        1. Olá, Verônica!
          Se oferecer ração, ele come?
          Se sim, pode ser uma preferência dele mesmo… Mas se o apetite dele for habitualmente caprichoso assim, vale a pena fazer exames para saber se ele tem algum problema renal ou hepático, por exemplo.

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